Por Fred de Faria Santos Silva, advogado (OAB-RS nº 65.687), especialista em Direito Civil e Processo Civil pelo IDC e sócio do Escritório Santos, Duarte & Minuzzi Advogados Associados.
Não é de hoje que as decisões judiciais também levam em consideração o que é postado/publicado nas redes sociais.
Faz alguns anos, em sua defesa processual, uma Companhia de Distribuição Rede Elétrica, utilizou cópias das telas do antigo Orkut.
Tratava-se de um processo em que um DJ afirmava que teria sofrido um choque num poste de rede de iluminação pública. Este choque teria lhe causado queimaduras nas mãos. Com o processo buscava indenizações e também “lucros cessantes” por ter ficado longo período sem poder trabalhar.
Entretanto, pesquisando as redes sociais, haviam publicações feitas pelo próprio Autor da ação informando sobre festas em que estaria trabalhando como DJ. Ou seja, para quem ele estava mentindo? Para o judiciário ou para o seu público?
Ele não estava impedido de trabalhar, continuou realizando as suas tarefas normalmente. Estava tentando levar vantagem econômica sobre a empresa.
Recentemente, uma notícia publicada no site do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul[1] em 16/02/2018, informa a decisão de um Magistrado que deixou de conceder a Assistência Judiciária Gratuita[2] à uma parte que ostentava, com fotografias e comentários no Facebook, uma vida financeira confortável.
Mais que isso, no processo se dizia desempregado, mas nas fotografias publicadas nas redes sociais aparecia dirigindo o caminhão em que trabalha.
Pois bem, é consenso que a boa parte das pessoas (para não dizer a maioria) somente publica nas redes sociais as coisas boas que acontecem em suas vidas. Desejam ser vistas por outras pessoas como bem sucedidas e felizes. Com isso supostamente elas ganham admiração, respeito e poder. No geral o ser humano busca exatamente isso: PODER.
Nem sempre (quase nunca) o que consta nas redes sociais confere com a realidade. Quando um internauta publica uma fotografia sua num restaurante caro, deixa a entender que ele está consumindo naquele local e que tem recursos financeiros para tanto. Porém, isso não significa que de fato ele consumiu naquele local, ou que foi ele quem pagou a conta.
É claro que este ato gerará consequências. Uma delas é fazer com que as pessoas que vejam aquela fotografia deduzam que ele está bem de vida. E talvez seja exatamente isso que ele queira demonstrar, mas muitas vezes não é a realidade.
Não é uma tarefa fácil dissociar a aparência da realidade. Os Magistrados têm que decidir com base na verdade. Mas qual é a verdade para o Magistrado? É o que ele está vendo no processo. E, em alguns casos, o que chega a ele é exatamente o que a parte quer demonstrar para “o mundo”, que ele está bem financeiramente e muito bem sucedido. Neste caso, não pode querer culpar a decisão do Magistrado que viu a parte usufruindo de bens, fazendo viagens e consumindo produtos e serviços caros. Se a parte “mentiu” para “o mundo”, mentiu também para o Magistrado que está inserido neste mundo.
No caso, a pessoa litigante quis mostrar em suas redes sociais que está bem financeiramente para que os outros vissem isso. De fato aconteceu! O juiz também viu.
É importante que as pessoas saibam que o judiciário está atento a tudo que acontece na sociedade, inclusive ao que é publicado nas redes sociais e isto de fato interfere nas decisões processuais.
[1] Acessado em 19/02/2018: http://www.tjrs.jus.br/site/imprensa/noticias/?idNoticia=416095
[2] AJG é um benefício concedido às pessoas que não têm condições financeiras de suportar as custas judiciais sem que isto prejudique seu sustento próprio ou de sua família, normalmente pessoas que percebem mensalmente um valor inferior à cinco salários mínimos nacionais.